As doenças cardiovasculares ainda lideram como as que mais matam em todo o mundo: um em cada três óbitos. O coração continua adoecendo silenciosamente e, assim, matando muita gente. Infelizmente, nós, cardiologistas, não somos suficientemente bons em prevenção. Nas últimas décadas, somente o controle do colesterol foi satisfatório, devido ao emprego de drogas redutoras de seus níveis. Diabetes tipo 2 aumentou, praticamente, em todas as regiões do planeta.
As drogas utilizadas, os “stents” coronarianos, a cirurgia cardíaca, os marcapassos e os desfibriladores automáticos implantáveis prolongaram a vida de muitos cardiopatas. Mas não conseguimos impedir o surgimento da doença. Como é difícil convencer nossos pacientes de que devem modificar seus hábitos de vida! Nossa dificuldade começa dentro das faculdades de Medicina. Desde o início, queremos ver doenças. O interesse pelo patológico é maior do que pelo funcionamento normal do corpo humano. Quando residentes, somos estimulados e nos excitamos diante da possibilidade de demonstrarmos nossas habilidades com procedimentos relacionados a salvar vidas.
Realmente, nenhum cardiologista esquece a poderosa sensação experimentada após recuperar alguém de uma parada cardíaca. As emergências e UTIs devem ter qualificação superior para garantir o melhor atendimento aos pacientes gravemente enfermos. Mas, se tivéssemos uma atenção preventiva melhor, será que um menor número desses pacientes não estaria ocupando espaço nessas emergências? Quem sabe não teríamos menos filhos sofrendo pela morte súbita de seus pais? Não perderíamos menos amigos queridos?
Pouca atenção damos à prevenção de forma efetiva. Congressos de cardiologia não incluem mais do que 10% de temas com foco na profilaxia primária. Em 35 anos de profissão, presenciei uma grande evolução no diagnóstico e tratamento das doenças cardiovasculares. No controle da hipertensão arterial, foi notável o surgimento de drogas eficazes e seguras. Entretanto, menos de 20% dos pacientes com pressão alta fazem o tratamento prescrito por seus médicos. Aumentam de peso, continuam sedentários e fumando. E ainda temperam tudo isso com muito sal! Não é um fracasso?
Quando determinamos a eficácia da medicina atual, quanto mais doente estiver uma pessoa, melhor. Portanto, temos um sistema de cuidados das doenças em vez de um sistema de cuidados de saúde. O custo econômico da prevenção primária não é elevado. A sua dificuldade está na conscientização. A abordagem será mais efetiva quanto mais precoce, isto é, junto aos jovens. Estes aprendem mais rápido e, assim, podem ensinar aos adultos no núcleo familiar.
Este texto foi extraido do Jornal Zero Hora . O autor é o cardiologista
Dr. João Carlos Guaragna, professor da Faculdade de Medicina da PUCRS.
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